sexta-feira, 2 de abril de 2010
Irmãos do mesmo saco.
Quando penso no arrebatamento não gosto de pensar nas teorias religiosas que ele está inserido. Penso em sua consequência, no que ficou depois dele. No que ficou "depois que Ana me deixou". Eu quero falar sobre ele ou ela que agonizam, agora, a partidade alguém ou de algo. Mas o assunto também não é despedida. É muito maior, entende? Não tem desejos de sucesso, nem comunicação por mídias alternativas. Não tem como saber se depois o outro, o que partiu, esta bem nesse lugar obscuro que ele agora habita. O problema não é o ato da partida, mas sim o que ela ocasiona em quem fica. Em quem sofre a dor deste fim. Sim. A palavra em questão é FINITUDE. Se, tudo acaba mesmo um dia, como classificamos o espaço da memória, dos resíduos que ficam a latejar no corpo e na paisagem? Como classificamos o eterno relembrar, remoendo todo e qualquer tipo de questão que, hoje, já não faz o menor sentido. Quando penso no Arrebatamento, quero saber qual é o sentimento de ser arrebatado. Penso na visualidade, no sumiço, nas soluções cênicas para tal. Quando penso no Arrebatamento, penso em como dar continuidade as coisas sem aquela que me parecia principal. Penso em cores, muito movimento, seis atuantes e três histórias. "Olha, antes do ônibus partir eu tenho uma porção de coisas para te dizer...". Mas o tempo também é finito e, por isso, não nos deixa dizer por completo o que desejamos, queremos e sentimos. Quando penso no Arrebatamento penso naquelas pessoas que morreram, mas foram eternizadas por seus acompanhantes. A casa ainda é de quem partiu. As escolhas ainda são divididas, de algum modo, com esse que se foi. Penso também na bailarina a ensaiar sua partitura, tentado chegar na perfeição e só atingí-la no momento de seu próprio Arrebatamento. Sua glória e sua decepção. Juntas. Penso também no mote: "o que te dói e o que te salva?". Penso na recosntrução de histórias a partir de fragmentos em discurso elaborado por diferentes pessoas que, consequentemente, apresentam diferentes visões sobre o mesmo tema, assunto, cor ou objeto. Penso na Bracher e em seu Antônio. Penso na "Sinuca de baixo d`água" que ainda nem terminei de ler. Mas também penso por isso. Penso na morte de Antônia relatada por Camilo, Polaco e Bernardo que não sabem lidar com a finitude, por exemplo, da vida. Mas também penso na criança que é arrebatada quando o tempo da mamadeira não se justifica mais. Depois que ele deixou o coelho cair na hora mais importante alguma coisa aconteceu. Alguém foi arrebatado nesse momento. A casa, as crianças e as estantes jamais serão as mesmas. Mas o que, de fato, foi arrebatado foi a relação que se criou em torno do coelho. As situações simples podem se transformar em situações limites de acordo com o valor e subjetividade que transferimos a elas? Não sei. Situações limites, o corpo esperando, agonizando e tudo partindo, indo pelos ares para nunca mais voltar. Ventania, tempestade, trovão. A natureza sendo arrebatada todo dia pelas ações do homem que ainda não consegue compreender as consequências de sua indiferença. Uma doença, um chocolate e até um abraço na hora errada. Tudo pode criar uma situação de arrebatamento. Só me resta saber como. COMO? como transformar em palavras e ação o que dentro de mim não se explica? o que dentro de mim se extende por todo o meu corpo. o que dentro de mim não lida bem com o fim. nem com o término de ciclos que eu gostaria que pudessem ser infinitos. O Arrebatamento - a obrigatoriedade de saber dizer tchau. ou a constatação da perda. ou a razão pela qual você se foi. ou a vida pode continuar. ou eu nunca mais voltarei a Londres. ou vou manter você vivo na nossa cama. ou o que virá depois. ou nada mais faz sentido depois que você se foi. ou o medo de abrir a porta. ou a dificuldade dançar sozinho. ou a janela aberta para você pular. ou mil pessoas partindo. ou o céu sem limites. ou a dor que agora sinto. ou a brevidade da vida. ou o vestido que nunca usei. ou NO DIA DO ARREBATAMENTO ESTE CORPO FICARÁ DESGOVERNADO
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Um comentário:
Esse texto não podia ser meu, porque é completamente seu. Mas nós sabemos como essa tal finitude me incomoda. Se é que incomodar é um verbo suficiente pra descrever essa agonia e angústia eternas.
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